Sem título

Naquela noite, ele não veio. Ficou apenas e tão somente decretado o toque de silêncio. Assim como, se, lhe houvera pregado um selo, daqueles bem antigos, o lacre vermelho que se derrete em presença do fogo; em seus grandes e carnudos lábios, gravado com o sino imperial, do conquistador absoluto e reinante daquela sebe; e assim foi que, a boca nua, consternada, obedeceu. Prova, a constatação dessa agora soturnidade solitária. Condenada para sempre, ficará à espera de algo que não mais virá! Por única e tão somente, a falta de um mea culpa, terás que guardar uma eternidade solitária, dentro de si e um rico balaústre que nunca mais será usado para lhes decorar o salão de festas; ambiente, agora, locupletado por desertos e relâmpagos

Do que adiantou ter escolhido o mais belo vestido? E ter alisado as coxas, deixando-as brilhantes? E usado as melhores cores combinantes para que se cumprisse o ritual para a boca sedenta?

Chegava tremer, tão somente em atentar para o fato em si, de, não mais sentir, que aqueles dentes brancos jamais tornarão a cravar-lhe a carne. Tudo tão distante de tudo e tudo tão próximo, tudo tão leve e pesado ao mesmo passo, transformando o corpo, inchando o ventre ao mesmo passo e tempo em que não reparava os impulsos frêmitos da língua roçando seca entre os lábios palpitantes. Sem largar frouxo nenhum assovio entre dentes, mirava as estrelas paisagem, contemplando-as, em um outro mundo, diferente mundo, muitissíssimo diferente do seu, orbe distante daqui. Para muito além desse, em que estava e vivia: prenunciando um outro mundo de espera e orfandade amarela.

A qualquer e algum pequeno sinal de atividade em sua volta e, a olhos vistos, reagia, arrancava compulsivamente, pequenas tiras da pele desidratada pela ação do salitre abundante. Não percebia, mas, exposta permanentemente naquele oceano de reveses, seguia-lhe marcando, dia a dia, a falta de sono e de apetite; lentamente, uma nódoa cinza-escuro em torno dos globos oculares que, junto ao passar do tempo, foi se tornando uma máscara azul, lilás, avinhada, deixando-lhe os traços do rosto firme, circunspectos e soturnos.

Mudou muito e mesmo, foi quando à beira-mar sentou-se no abismo profundo de cheiros e lembranças. A vista estendeu-se para muito longe, e além de fronteiras absurdas, adormeceu. E no lugar dos seus sonhos, em que foi parar, Gina, a amante renascia vibrando em cada célula à flor-da-pele, a sedução em plena jovem e recém-brotada orquídea vermelha, tragava seu conquistador sua nau e sua esquadra por inteiros, de uma só vez. Engolia todas as terras que formavam o país distante de seu descobridor e suas máquinas maravilhosas em uma só tragada, um talagaço sísmico, pondo um fim e um termo, uma laje de pedra tumular a todos os habitantes daquela região de Armandaluzia.

Menos ao seu amado: poupara-o, a vida, para transformá-lo definitivamente em habitante solitário da torre medieval, erigida com os seus seios boschianos; levado até lá, pelas próprias mãos da amada. Ou então, se resolvesse por fim, decidir pelo seu total desaparecimento, saberia, aonde fazê-lo, lançando-o, totalmente, dentro de sua fornalha interior que ardia um calabouço de delírios.

Noite inútil elevada à categoria de maldita espera. Amaldiçoada, noite, será entre os cães dos sete portais. A amálgama do tempo lhe aprisionará entre cadentes cadeias. E assim será! Não há mais remédio!

Da parte que silencia significa dizer é que, quanto maior o desejo em se encontrarem, não o terá, jamais. E tanto maior o gozo dos beijos, mais para além de lá estará distante; Maior de tudo, mesmo, foi o egoísmo que, a ambos trouxe somente o mal e assim os fez distante: logo agora, gestando uma vida que não sabia, e lho anunciaria hoje à noitinha, após sua chegada.

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